Um desdobramento da «tese do século» – que excluiu o ICMS do cálculo do PIS e da Cofins – pode deixar a conta a ser paga pela União superior ao valor estimado de R$ 358 bilhões. Por isso, segundo advogados, haveria possibilidade de obter o direito a um volume maior de créditos. Quando o contribuinte vence uma discussão sobre cobrança de tributos, tem o direito de receber de volta o que pagou a mais desde os cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação. Quando o Supremo Tribunal Federal julgou o tema optou por modular os efeitos da decisão, limitando-os no tempo.
Contribuintes que ajuizaram ação até o julgamento de mérito têm o direito à restituição integral – desde os cinco anos anteriores à ação. Mas para quem ajuizou ação depois de 15 de março de 2017 a recuperação do passado ficou limitada. Uma empresa que entrou com o processo em 2018, por exemplo, só pode recuperar o que pagou de forma indevida desde 15 de março de 2017. O Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação estima que a tese do século gerou R$ 358 bilhões em créditos tributários.
A empresa que optar por aderir à proposta das associações e dos sindicatos poderá usar a ação coletiva para ter acesso a créditos que não seriam alcançados com a ação individual. Dois clientes dos advogados Luca Salvoni e Gabriel Baccarini, do escritório Cascione, receberam oferta para se beneficiar de decisão coletiva. Como os sindicatos ajuizaram os mandados de segurança no ano de 2006, os associados poderão ter o direito de receber a restituição desde 2001. Apesar de o Superior Tribunal de Justiça permitir a filiação tardia – após o ajuizamento da ação coletiva -, eles ponderam que não há decisão na Corte a respeito, relacionada especificamente à tese do século.
Além disso, complementa Baccarini, o Judiciário pode interpretar como um desrespeito à modulação de efeitos estabelecida pelo STF. Existe pelo menos uma decisão sobre o tema. Uma empresa do setor de alimentos foi à Justiça pedir para aproveitar os créditos fiscais por meio de uma decisão coletiva. O mandado de segurança foi ajuizado pela associação em 2006 e a empresa se filiou em 2021.
Considerou que haveria violação à decisão do STF. Para ter acesso ao benefício, disse, a empresa deveria comprovar filiação anterior a 15 de março de 2017 – período que escapa da modulação de efeitos. Declarou que permitir o uso dos créditos «implica a possibilidade de verdadeiro comércio de decisões judiciais por associações com objeto genérico» . O Fisco tem até cinco anos para fiscalizar as compensações de créditos tributários feitas pelos contribuintes.
Se entender de modo contrário à empresa, os tributos pagos com o crédito ficam em aberto e, além de arcar com juros e correção, terá que pagar multa. «Em algumas situações pode fazer sentido. Mas em outras a empresa pode achar que está ganhando um crédito quando, na verdade, está ganhando um possível passivo futuro», observa Leo Lopes, sócio do FAS Advogados. Para uma empresa cliente dele que recebeu a proposta, por exemplo, a mudança de sindicato demandaria ajustes internos.
Essa cobrança varia entre 20% e 30% dos créditos que se pretende recuperar e a maioria cobra no momento em que a empresa afirma ter interesse em usar a decisão. A ANCT foi procurada pelo Valor e afirmou, por meio de nota, que «repudia veemente qualquer entendimento que se manifeste contrário aos direitos dos contribuintes em obter restituição/compensação dos tributos pagos a mais», especialmente quando há decisão do STF – caso da tese do século.